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Categoria: Laicidade

29 de Dezembro, 2010 Carlos Esperança

Diploma de apoio ao ensino privado

Cavaco Silva, depois da ameaça pública de veto, a que se chamou diálogo entre o PR e o Governo, promulgou o regime de apoio ao ensino privado.

A decisão sobre o regime referido é da competência do Governo mas a intromissão do PR, num diploma que exorbita a sua competência, e a publicidade que quis dar ao seu direito de veto, revela bem a pressão da ICAR e a sua influência eleitoral.

Quando o PR afirma esperar que prevaleça o bom senso fica a saber-se que quer aludir à sua forma de interpretar o interesse nacional, de acordo com os interesses dos donos dos estabelecimentos de ensino privado, à custa do erário público.

As escolas privadas são instituições lucrativas destinadas a quem as quer e pode pagar. Não podem ser um sorvedouro de dinheiros públicos, o instrumento de transferência de recursos do Estado para mãos privadas nem o subsídio a projectos confessionais.

A ruidosa ingerência presidencial piorou o diploma que vai regular a relação do Estado com os estabelecimentos do ensino particular e cooperativo.

Havendo na área escolas públicas, cuja cobertura nacional é obrigação do Estado, a que propósito se financiam estabelecimentos particulares cujos professores estão isentos dos concursos públicos e a aceitação dos alunos depende dos proprietários?

O ensino público, laico, gratuito, universal e de qualidade, deve ser separado do ensino privado. É a tarefa que incumbe ao Estado para assegurar igualdade de oportunidades, sem discriminação de nascimento, poder económico ou orientação confessional.

O presente diploma foi modificado para pior e traz consigo a ameaça da manutenção do ensino nas escolas religiosas à custa do erário público.

16 de Dezembro, 2010 Carlos Esperança

A laicidade como condição de sobrevivência

A luta partidária dos países democráticos, com a consequente necessidade de caça ao voto, tem levado os Estados laicos a uma estranha cumplicidade com as religiões, não se limitando a garantir a liberdade de culto – como é seu dever –, mas subordinando-se aos interesses da religião dominante.

A globalização trouxe consigo a possibilidade de expansão de todos os credos à escala mundial, aspiração que os apóstolos acalentavam, sem contarem com concorrência. Na Europa os cristãos ortodoxos procuram manter privilégios ancestrais  e conquistar os países da ex- URSS; o Vaticano pretende opor um dique ao islão e atrair os anglicanos enquanto combate o secularismo e a laicidade; as seitas evangélicas desejam penetrar no mercado enquanto o Islão, ressentido com o seu atraso e o fracasso da civilização árabe, procura islamizar o mundo nem que seja à bomba.

A Suécia acaba de ser vítima do primeiro acto de terrorismo suicida cuja origem aponta para a demência islâmica. Segundo documentos dos EUA, difundidos pela WikiLeaks, a Catalunha é o principal centro do islamismo radical no Mediterrâneo. Na memória dos europeus perduram os actos terroristas de 11 de Março de 2004 na estação ferroviária de Alcalá, em Espanha, os atentados de 7 de Julho de 2005 no metro de Londres, a onda de ameaças por causa dos cartoons de Maomé, na Dinamarca, e as ameaças da Al-qaeda.

Se os crentes das várias religiões se limitassem a salvar a alma que acreditam ter e não tivessem no caderno de encargos a obrigação de salvarem os que não querem ser salvos, tudo seria pacífico. Nenhum céptico, ateu, livre-pensador ou agnóstico se interessa pelo número de orações que crentes os rezam, os jejuns a que se submetem, a abstinência que guardam, os alimentos que proscrevem ou a vida sexual que têm. O problema reside no desvario de quem pretende impor aos outros os seus valores particulares, convencido de cumprir a vontade do deus que lhe impuseram.

A Física, a Química e a Biologia, por exemplo, todos os dias mudam e enriquecem com novas descobertas. As ciências, apesar do azedume das religiões, evoluem a um ritmo que deixa a fé, desorientada, a ruminar livros antigos e velhos preconceitos.

O horror cristão ao secularismo só tem paralelo na aversão do Papa ao preservativo. Os judeus, menos de 20 milhões, ainda reclamam a herança divina da Palestina para as suas tribos. Os islamitas, desesperados, agarram-se ao Corão como náufragos a uma jangada, sem espírito crítico, com horror ao progresso, à liberdade individual e à modernidade.

A reislamização da Turquia é um intuito perigoso contra o espírito laico das suas elites, uma obsessão do actual primeiro-ministro simpatizante do negócio dos tapetes para as orações. A Espanha enfrenta a fúria papal que a quer devolver ao redil do Vaticano e o assédio do islamismo que a pretende transformar num novo califado.

Ai da Europa, ai de nós, da liberdade, da herança do Iluminismo e da modernidade, se os Estados, com a conivência de uma esquerda pouco inteligente e de uma direita beata, abdicar da laicidade e deixar o fanatismo religioso à solta numa sofreguidão prosélita.

Sem laicidade, imposta sem subterfúgios, a Europa das Luzes pode regredir e tornar-se o espaço beato onde o poder democrático ceda o lugar à vontade do deus que ganhar a batalha da fé pela força das armas e pelo terror.

13 de Dezembro, 2010 Eduardo Patriota

Em Salvador, campanha ateísta em ônibus é barrada

Imagens dos cartazes da campanha ateísta em ônibus no Brasil

Empresas de mídia barraram uma campanha publicitária com dizeres contra a religião patrocinada pela Atea (Associação Brasileira de Ateus e Agnósticos). As firmas se recusaram a veicular os anúncios mesmo depois de o contrato já ter sido assinado. A Atea estuda as medidas judiciais cabíveis.

As empresas que decidiram barrar a campanha, na verdade, só estão defendendo o seu lado. Há passageiros que se recusam a entrar em ônibus “ateus”, além de pessoas que poderiam reclamar da campanha, afetando negativamente a imagem da mesma perante a sociedade.

Independente do teor da campanha, o presidente da ATEA disse o óbvio:

As seguidas recusas de prestação de serviço são uma confirmação contundente da força do preconceito contra os ateus, e da necessidade de acabar com ele. Nossas peças nada têm de ofensivas, e o teor de suas críticas empalidece frente às copiosas afirmações dos livros sagrados de que ateus são odiosos, cruéis, maus e devem ser eliminados. Existe um duplo padrão em ação aqui“, diz Daniel Sottomaior, presidente da Atea.

As peças de propaganda, com frases como “Religião não define caráter” e “A fé não dá respostas; ela só impede perguntas”, deveriam circular em ônibus de Salvador, São Paulo e Porto Alegre pelo período de um mês. A recusa ocorreu primeiro em São Paulo e depois em Salvador, sob a alegação de que as mensagens poderiam violar dispositivos das respectivas leis de publicidade em espaços públicos.

Fica óbvio que se a propaganda fosse louvando Jesus ou qualquer outro tipo de religião, “misteriosamente” não haveria nenhuma lei impedindo a divulgação da mesma.

6 de Dezembro, 2010 Eduardo Patriota

Justiça de SP quer retratação de TV por ofensa a ateus

Um pouco de sensatez da justiça brasileira na defesa por um Estado laico.

O Ministério Público Federal entrou com ação civil pública, com pedido de liminar, para que a Rede Bandeirantes de Televisão se retrate publicamente por ofensas divulgadas pelo apresentador José Luiz Datena no programa “Brasil Urgente” contra ateus.

No programa veiculado no dia 27 de julho, Datena comentou por mais de 50 minutos um crime na companhia do repórter Márcio Campos. De acordo com o MPF, o apresentador fez associações preconceituosas entre criminalidade e descrença religiosa, apontando as pessoas que não creem em Deus como os responsáveis pela deterioração da sociedade. “É por isso que o mundo está essa porcaria. Guerra, peste, fome e tudo mais, entendeu? São os caras do mau. Se bem que tem ateu que não é do mau, mas, é …, o sujeito que não respeita os limites de Deus, é porque não sei, não respeita limite nenhum“, afirmou o apresentador.

Datena também afirmou que o crime em questão fora obra de pessoas sem limites. “Esse é o garoto que foi fuzilado. Então, Márcio Campos, é inadmissível, você também que é muito católico, não é possível, isso é ausência de Deus, porque nada justifica um crime como esse, não Márcio?”.

Em setembro, a Associação Brasileira dos Ateus e Agnósticos (Atea) entrou com processo contra a Band e Datena por preconceito. As ações foram enviadas ao Fórum de Taubaté (SP) e ao Tribunal de Justiça da Paraíba.

24 de Novembro, 2010 Ricardo Alves

Não há crise no Serviço Nacional de Religião

Não contente com remunerar, com dinheiro estatal, mais de uma centena de capelães (todos católicos…) nos hospitais, a ministra da Saúde vem agora propor que os capelães hospitalares se desloquem também aos domicílios dos pacientes.
Imagino que o passo seguinte seja pagar aos padres para irem a casa das pessoas dizer missa. Como se a religião fosse um serviço público. Que não é, pois trata-se do exacto contrário: de um serviço privado que deveria ser assegurado pelas comunidades religiosas e pago por quem dele necessita, nunca pelo contribuinte.
Alguém disse que há falta de dinheiro no Serviço Nacional de Saúde?
18 de Novembro, 2010 Eduardo Patriota

Bombeiro paulista proíbe crucifixo e causa polêmica

A ostentação de símbolos religiosos em prédios públicos no Brasil é um tema permanentemente polêmico. Se por um lado o estado é laico e deve preservar sua neutralidade no campo religioso, por outro lado não podemos dizer que uma cruz discreta seja realmente um incômodo.

Em Tatuí, interior do estado de São Paulo, uma ordem de serviço assinada pelo comandante do Corpo de Bombeiros, capitão José Natalino de Camargo, causa polêmica na cidade. Ele mandou retirar todos os crucifixos e imagens de santos católicos das unidades sob seu comando. Os 11 vereadores da Câmara local assinaram moção repudiando a medida tomada pelo militar. Camargo alegou que a exibição de símbolos católicos em repartições públicas causa “constrangimento” a pessoas que professam outra fé.

Para ele, imagens e crucifixos fazem “apologia” da religião católica e contribuem para a “manutenção da falsa crença de que aquela religião seria a única detentora da benesse estatal”. O capitão invocou ainda a Constituição Federal que, segundo ele, estabelece que o Estado brasileiro é laico e, portanto, a exibição dos símbolos seria ilegal e inconstitucional.

O que é notório na questão é a reação imediata dos “nobres” vereadores. Ora, com ou sem cruz, os bombeiros funcionarão do mesmo jeito. E, gostem eles ou não, o capitão tem autoridade para organizar suas unidades como bem entender. Curioso é ver todos os vereadores, pelo visto homens muito ocupados, assinarem uma moção de repúdio justamente depois de assistirmos uma das eleições mais hipocritamente religiosas de todos os tempos. Estariam os vereadores realmente preocupados com a questão religiosa? Quanto ao “ato arbitrário”, novamente, o capitão fez porque pode fazê-lo. Desde quando a decisão de um chefe virou “ato arbitrário”? Na tentativa de desqualificar o capitão, os vereadores escorregam na demagogia.

7 de Novembro, 2010 Ricardo Alves

Se Ratzinger fosse apenas um líder religioso

O problema que Ratzinger gera em cada visita que efectua é amplificado pela sua dupla qualidade de líder religioso e chefe de Estado, e pela sua recusa em separar as duas condições. Em Espanha, foi recebido no aeroporto pelo filho e pela nora do rei, apesar de a visita, supostamente, ter apenas «carácter pastoral» (e não ser uma visita de Estado). E quando partir terá a presença do Primeiro Ministro espanhol no aeroporto.

Em Portugal, sendo uma «visita de Estado», foi recebido no aeroporto pelo Presidente.

Se o Vaticano não fosse reconhecido como «Estado» (e há boas razões para que não o seja), os seus pronunciamentos não seriam tão amplificados pela relevância de alguém que não seria necessariamente recebido pelas mais altas autoridades do Estado. Uma igreja não necessita de ser um Estado, e o problema político que Ratzinger representa seria assim limitado.

Persistiria o problema gerado por os Papas não conseguirem circunscrever-se a «assuntos espirituais», e insistirem em pronunciar-se sobre leis que são feitas para cidadãos, e sobre comportamentos sociais que não se enquadram nos parâmetros do catolicismo.

Se a sobrevivência da «Monarquia Católica do Vaticano» é um problema de laicidade que só estará resolvido quando a ICAR deixar de se arrogar privilégios estatais, a verdade é que só nesse dia poderemos então ter um verdadeiro diálogo, porque mais justo e menos desigual, sobre as ideias que o senhor Ratzinger tem do casamento, da IVG, ou do papel da mulher na sociedade. E aí o problema será outro: o catolicismo não ser uma mera doutrina espiritual, mas também uma doutrina social e política.

[Diário Ateísta/Esquerda Republicana]

24 de Outubro, 2010 Fernandes

Uma mão lava a outra

No dia em que o país celebrou a separação entre Estado e Igreja Católica, José Sócrates foi a Alfragide (Amadora) inaugurar… um templo católico. Agora, o governo revoga benefícios às instituicões religiosas mas não os tira à Igreja Católica.

Nos membros das comunidades religiosas não católicas, colocados a par da decisão governamental, a primeira impressão foi de incredulidade e a segunda de espanto. A mesma reacção encontrou-se na comissão da liberdade religiosa, órgão independente de consulta da Assembleia da República e do Governo, prevista na Lei de Liberdade Religiosa (Lei 16/2001) e com “funções de estudo, informação, parecer e proposta em todas as matérias relacionadas com a aplicação da Lei de Liberdade Religiosa”.

18 de Outubro, 2010 Ricardo Alves

«Ofereçam-me aquilo que já uso», diz padre

Há uma igreja para os lados de Campolide que mete água. Literalmente. É propriedade do Estado, como todas as outras igrejas que, em 1911, se mantiveram propriedade do Estado mas foram cedidas gratuitamente para aí se continuar a realizar o culto católico.

O pároco local, não contente com celebrar cultos religiosos num edifício do Estado sem pagar renda, exige que a República lhe ofereça o edifício, graciosamente. (E fala em «roubo». Estranho roubo, em que o usufruto continua a ser de quem se diz «roubado»…)

Se a moda pegasse, todos os templos católicos do território que são propriedade do Estado poderiam ser reclamados pelas paróquias respectivas. «Gratuitamente».

O Ministério das Finanças já desceu o preço de venda para a bagatela de 233 mil euros. Deveria ser um pouco mais exigente, porque a confissão religiosa em causa é a mesma que constrói modestas catedrais de 70 milhões de euros.

[Esquerda Republicana/Diário Ateísta]