Loading

Categoria: Fátima

25 de Fevereiro, 2021 João Monteiro

Hospitais públicos não podem ser memoriais religiosos

Tomei conhecimento de que existe no Hospital Dona Estefânia um memorial religioso dedicado à Jacinta Marto – uma dos três pastorinhos que alegadamente terá vivido o suposto “milagre” de Fátima.

As fotografias foram ontem partilhadas na conta de twitter da Associação República e Laicidade. Num Estado laico não deveriam existir referências religiosas no espaço público, por duas razões principais: porque não existe uma religião de Estado e porque o espaço público pertence a todos independentemente da sua crença ou ausência dela. O facto de o memorial ter surgido por iniciativa de uma organização católica – “Liga da Acção Católica Femenina da Freguesia dos Anjos (1943)” – e lá permanecer até aos dias de hoje é uma descriminação face às outras religiões, bastando perguntar-nos: seria hoje permitido no mesmo local um memorial judaico ou muçulmano?

Tweet da Associação República e Laicidade

Um dos comentadores do referido tweet justifica a existência do memorial argumentando que “releva a importância histórica e espiritual das instituições hospitalares públicas”. Contudo, não é essa a função de um hospital público num Estado laico, é antes tratar e cuidar dos pacientes. O papel espiritual caberá a outras instituições.

Sobre o fenómeno de Fátima, acreditemos nele ou não, enquanto fenómeno social faz parte da história de um período do nosso país, que merece ser estudado, analisado, criticado e até exposto. Porém, se há lugar para realizar cada uma destas iniciativas, decerto não o será num hospital público.

Não nego o valor patrimonial e histórico das peças ali exibidas e por isso deixo uma proposta: a remoção das placas evocativas e a sua preservação, para futura exposição em local adequado (museu ou outro espaço visitável) com referida contextualização.

14 de Maio, 2018 Carlos Esperança

Fátima, terra de fé – Ontem foi o 101º aniversário da sua criação

Nascida para lutar contra a República e transformada em arma de arremesso contra o comunismo, Fátima mantém-se como símbolo da crendice popular e caixa de esmolas que sustenta a máquina eclesiástica.

Os ateus são sensíveis ao sofrimento humano, às manifestações de aflição, ao desespero e aos dramas individuais que exoneram a razão dos comportamentos. Já não podem ter a mesma benevolência para quem convence os crentes do gozo divino com as chagas nos joelhos e as maratonas pedestres ou com a oferta de objetos de ouro que atravessaram gerações na mesma família para acabarem no cofre forte da agiotagem mística.

Os alegados milagres das cambalhotas solares, das deambulações campestres da virgem e da aterragem de um anjo não foram originais nem exclusivas da Cova da Iria. Foram tentados em outras latitudes e repetidos em versões diferentes até atingirem a velocidade de cruzeiro da devoção popular e o pico da fama que tornou rentável a exploração.

Em 2008, o cardeal Saraiva Martins, um clérigo atrofiado por longos anos de Vaticano, dedicado à investigação de milagres e à pesquisa da santidade, presidiu à peregrinação… contra o ateísmo. Podia ser a favor da fé, mas o gosto do conflito levou a Igreja a deixar cair a máscara da paz e a seguir o carácter belicista que carrega no código genético.

Há militares que regressaram há mais de cinquenta anos da guerra colonial e ainda hoje, vão a Fátima agradecer o milagre do retorno, milagre que muitos milhares não tiveram, vítimas da civilização cristã e ocidental para cuja defesa o cardeal Cerejeira os conclamava.

Perdido o Império, desmoronado o comunismo, o negócio mudou de rumo e de ramo. É o emprego que se mendiga a troco de cordões de oiro, a saúde que se implora de vela na mão, a cura suplicada com cheiro a incenso e borrifos de água benta. Enquanto houver sofrimento o negócio floresce. Dos bolsos saem os euros dos peregrinos e dos olhos dos crentes as lágrimas, perante a imagem de barro que a coreografia pia carrega de emoção.

Para o ano, no mesmo dia, repete-se a encenação e o coração dos devotos rejubila com a fé na virgem, igual à que os índios devotavam às fogueiras para atraírem chuva. Com os joelhos esfolados, os pés doridos e o coração a sangrar.

21 de Abril, 2018 Carlos Esperança

Fátima, altar da fé

(em regressão)

A religião é um embuste grosseiro que alimenta poderosas máquinas clericais, obscuros interesses privados e redes de cumplicidades que atravessam o globo.

Sob a capa untuosa do clero que finge defender a paz e promover a harmonia, jogam-se poderosos interesses e definem-se estratégias globais de conquista do poder.

Há quem pense que as religiões são um mal necessário, que são como armas nucleares cujo equilíbrio do terror impede uma guerra global. Mas enquanto os Estados não têm disparado as armas nucleares contra os seus cidadãos, as religiões espalham o medo, a superstição e o ódio e incitam a guerra e a violência contra infiéis (fiéis de outro deus).

À medida que a instrução e a ciência avançam, as religiões definham, mas agravam a virulência e, na aflição, a agressividade e o ódio que devotam à liberdade, à democracia e ao livre-pensamento.

Nos últimos dias temos assistido à mais violenta e sinistra ofensiva da ICAR contra o Governo de Espanha e à tentativa desesperada de virar o povo contra os seus órgãos legítimos. Até o referendo à Constituição europeia, cuja abstenção fomentou, lhe serve para promover o divórcio entre as camadas mais embrutecidas da população e o Governo legítimo.

À azia que o clero carrega depois de ter abençoado o casamento da plebeia divorciada com o príncipe herdeiro, com pompa e circunstância, junta agora a brotoeja que lhe provoca o casamento de homossexuais, a liberdade religiosa e o uso do preservativo. A Cúria romana reagiu como se a grande nação ibérica fosse ainda um protetorado sob o domínio de um rei absoluto dominado pelo confessor católico.

Em Portugal, um comportamento discreto e dissimulado foi a regra até à assinatura do aborto e abuso clerical que é a Concordata. A partir de então a chantagem aumentou. À medida que a clientela se afasta, o acréscimo de poder e as exigências de visibilidade aumentaram. A luta contra a maçonaria foi o primeiro ensaio de uma guerra mais vasta contra os sectores laicos, agnósticos e ateus.

Sirvam de consolo os revezes na conquista de novos clientes. Fátima, o supermercado da fé católica, a maior área de oração em Portugal, não deixa de perder peregrinos desde 2000, data da última visita do Papa JP2, num extremo esforço de marketing para manter e aumentar a clientela. Em 2004 teve menos meio milhão de peregrinos apesar de haver mais grupos organizados pelas agências turísticas. O mercado da fé, no que diz respeito aos peregrinos, retraiu-se em mais de 10%, nos últimos anos, só interrompido com a vinda do Papa em 13 de maio de 2017. Até atividades de lazer místico (terço, adoração, procissão das velas, laudes, vésperas) sofreram uma razoável retração. As próprias maratonas de joelhos (populares exercícios sadomasoquistas) vão perdendo praticantes.

Não há só más notícias.