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O milagre dos pastorinhos

Lembro-me do velho Hospital Distrital de Leiria e da magnífica escadaria de mármore partida a camartelo para se proceder a obras de remodelação, depois de retirada a foto imponente do virtuoso bispo D. Manuel de Aguiar sob cujos auspícios fora construído o edifício.

No respectivo piso, entre várias enfermarias, ficavam as Medicinas. Na de  Mulheres havia uma mesinha de cabeceira que dava nas vistas pela parafernália de senhoras de Fátima, pastorinhos e outras imagens pias que a ornamentavam. Ficava junto à cama de uma paralítica que, durante a noite, se arrastava até junto das camas de outras doentes para lhes impedir o descanso.

Gozava essa internada da fama de má e da inimizade de outras doentes mas era a dilecta do Director do Serviço, Dr. Felizardo, enternecido com a devoção e extasiado com as suas imagens de santos e veneráveis.

Um dia, nas suas férias, o médico José Luís Alves Pereira deu-lhe alta por entender que não padecia de qualquer moléstia do foro da medicina, o que, no regresso, enfureceu o Dr. Felizardo.

A D. Emília, Emília de Jesus, voltou à enfermaria e foi, de novo, integrada no espaço que lhe servia de asilo e de local de devoção.

As transferências para Psiquiatria, no Hospital da Universidade de Coimbra, eram reservadas a períodos de maior necessidade. Segundo o psiquiatra, Marques Pena, a D. Emília padecia de uma enfermidade que a podia conduzir à cegueira, à paralisia ou a outras mazelas, por períodos de maior ou menor duração. No respectivo processo clínico dos Hospitais da Universidade de Coimbra hão-de constar dados rigorosos se, acaso, um qualquer milagre o não fez desaparecer.

Mas voltemos a Leiria e à D, Emília de Jesus cuja paralisia já era reincidente e que foi curada por intercessão do Francisco e da Jacinta, bem necessitados de um milagre para a beatificação.

Graças à devoção, sarou de novo e passou a andar, tendo morrido pouco tempo depois, completamente curada. O milagre, depois de averbado nas provas de beatificação dos pastorinhos, que prestaram com distinção, deixou de interessar à Igreja, sendo discreto o funeral da D. Emília Santos onde, a título meramente particular, se integrou o bispo de Leiria, D. Serafim Ferreira e Silva.

A divulgação do milagre da paralítica foi feita com pompa e circunstância pelos canais habituais, invocando os depoimentos de três médicos diferentes, nisto a Igreja católica é muito céptica, unânimes a atestar a intervenção sobrenatural.

Por divina casualidade, a certificação do milagre foi atestada pelo Dr. Felizardo Prezado dos Santos, pela Dr.ª Maria Fernanda Brum, por coincidência esposa do primeiro, e pela psiquiatra Paula Cristina Amaral Brum Prezado Santos, filha de ambos, todos da Associação dos Servitas de Nossa Senhora de Fátima.

Digam lá, leitores, se, depois do que aqui se diz, ainda há quem duvide da veracidade do milagre! É preciso ser muito desconfiado. Leiam isto enquanto há testemunhas porque, um dia, há-de constar que à D. Maria Emília Santos lhe cresceu uma perna amputada.

4 thoughts on “O milagre dos pastorinhos”

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  • papapaulo

    As carecas vão-se descobrindo. É uma questão de tempo, por muito que seja, até que a maioria das pessoas se aperceba do embuste.
    Até lá, teremos 350.000 pessoas que, como disse a jornalista da SIC, “estão alheadas dos problemas do país”.
    Circo já temos. Era bom que também nos dessem o pão, mas parece-me é que nos vão tirar

  • antoniofernando

    Acredito em Deus e na dimensão sobrenatural da Vida.Ou melhor,admito como plausível que aquilo que hoje qualifico como ” miraculoso” ou ” sobrenatural” possa vir a ser explicado a partir de uma análise mais profunda e aprimorada do Conhecimento, incluindo o científico, reinterpretando o que hoje, alguns de nós, consideram como superação das leis da natureza. A realidade da Vida será toda a que for. E não penso como razoável aceitar que em 2010 todo o Conhecimento esteja já cientificamente adquirido. Não conheço detalhadamente o que ocorreu com Emília de Jesus. Se a sua cura é cientificamente explicável ou não.Mas, no mínimo, admito que a força de vontade,a devoção ou a crença possam contribuir para superar problemas físicos tidos por insuperáveis.À medida que a Ciência vai progredindo, todo um mundo maravilhoso se vai revelando.Einstein sentiu essa dimensão maravilhosa do Cosmos e interpretou-a religiosamente, embora na sua particular visão pananteísta que muito admiro.A dúvida metódica é um Bem em si. O preconceito, ateísta ou teísta, não.O cepticismo crítico é também um Bem. Contribui para a reflexão sobre os acontecimentos da vida, por muito naturais ou misteriosos que sejam. A vida é o que é. Mas ainda há tanto para descobrir…

  • LuisAlmeida

    Muito bom ! A frase : ” tendo morrido pouco tempo depois, completamente curada.”, então, é deliciosa !

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