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A defesa da laicidade é uma obrigação cívica

Não escrevo para que os leitores elogiem, mas para que leiam e pensem. Não é popular ser ateu, republicano e social-democrata. E sou. Defendo e promovo o republicanismo e a social-democracia, esta última sem confusões com a deriva neoliberal dos partidos que dela se reclamam e a traem.

E não promovo o ateísmo! É uma opção filosófica individual como o deveriam ser as religiões. Defendo, sim, a laicidade, e denuncio todos os ataques de que é vítima, sejam lambidelas presidenciais de anelões episcopais, cedências da República a atos pios ou a conivência estatal com o mais venerado embuste português do século XX – Fátima.

Tenho como aliadas a Constituição da República e a própria Lei da Liberdade Religiosa, e como adversários os autarcas que patrocinam excursões pias, os governos que deixam as Forças Armadas, bem ataviadas e luzidias, carregar andores e engrossar procissões, e todos os que usam as funções públicas para promover a fé individual.

A escola pública, onde tantas vezes as suas direções estão mais interessadas na salvação da alma do que no respeito pela neutralidade ideológica do ensino, é o lugar de eleição para a cidadania e não para o proselitismo. Hoje é a imagem pia que entra à sorrelfa pela porta das traseiras para a peanha de uma discreta sala, depois o regresso à separação dos sexos e à humilhação feminina e, finalmente, cinco pausas diárias para orações.

Os hospitais públicos enchem-se de crucifixos e senhoras de Fátima, com diretores que convidam os bispos para a cerimónia de posse. Amanhã terão um sheik a pôr em xeque a laicidade do hospital e a exigir que a sua mulher seja atendida apenas por uma médica. Antes, ainda encomendarão missas de ação de graças pelo cargo que lhes confiaram, o que, devido à leveza ética e indignidade cívica dos protagonistas, se justifica.

A subserviência à religião dita maioritária é a porta de entrada para a chantagem que as minoritárias, mais agressivas, não deixarão de fazer.

Cada vez que a mulher de um Presidente da República cobre a cabeça perante o Papa ou um aiatola, tapa o vácuo que a habita e insulta a luta das mulheres ao longo da História, eternas vítimas da misoginia e do tribalismo patriarcal que as condenou ao sofrimento e à subalternidade. O véu na cabeça oca do adereço de um PR é um retrocesso indecoroso ao tempo em que às mulheres eram vedados todos os direitos. E é também um sinal de aceitação de que o cargo é um direito do macho.

A iníqua discriminação da mulher por qualquer ideologia política, religiosa ou filosófica não pode ser uma questão cultural, deve ser um caso de polícia.

Malditas tradições!

1 thoughts on “A defesa da laicidade é uma obrigação cívica”
  • João Pedro Moura

    CARLOS ESPERANÇA disse:

    1-«Não escrevo para que os leitores elogiem, mas para que leiam e pensem.»

    E já agora, por que não admites que os leitores, ao lerem e pensarem, te possam criticar e tu leres as críticas e, eventualmente, corrigires os dislates e/ou teres a humildade de responder?!…

    2- «Defendo e promovo o republicanismo e a social-democracia, esta última sem confusões com a deriva neoliberal dos partidos que dela se reclamam e a traem.»

    O que será essa famigerada “deriva neoliberal”, dissociável e “traidora” da “social-democracia”?! E esta o que é?!
    Tu, em matéria de política, não deves saber bem o que és ou o que defendes…

    3- «E não promovo o ateísmo! É uma opção filosófica individual como o deveriam ser as religiões.»

    “God damned”!!! “What”???!!!
    O principal redator dum diário chamado “de uns ateus” não promove o ateísmo???!!! Então, o que é que andas a promover nas páginas deste diário, há anos???!!! Politiquices sofríveis?!
    Os teus artigos provocatórios e satíricos, e, reconheça-se, tendencialmente excelentes, sobre a palhaçada religiosa, o modo como desmontas, irónica e sarcasticamente, os atos e ditos dos insignes corifeus da clericalha tartufa e das suas bases bíblicas e alcorânicas, mais os próceres políticos e outros figurões que proferem ou cometem coisas similares, então isso não é promover o ateísmo???!!!…

    4- «Defendo, sim, a laicidade, e denuncio todos os ataques de que é vítima,»

    Claro, claro! Mas isso é o que faz um bom ateu militante…
    …Redator dum diário ateísta e não apenas dum diário laicista…

    5- «Hoje é a imagem pia que entra à sorrelfa pela porta das traseiras para a peanha de uma discreta sala, depois o regresso à separação dos sexos e à humilhação feminina e, finalmente, cinco pausas diárias para orações.»

    “Cinco pausas diárias para as orações»???!!! Não me digas que o Islão anda já aí a ameaçar tomar as terras “cristãs”!…
    Pessimista! Andas a ver o Alá em todo o lado, a entranhar-se denodadamente no tecido social…

    6- «Os hospitais públicos enchem-se de crucifixos e senhoras de Fátima, com diretores que convidam os bispos para a cerimónia de posse. Amanhã terão um sheik a pôr em xeque a laicidade do hospital e a exigir que a sua mulher seja atendida apenas por uma médica.»

    Antimuçulmano primário, “islamófobo”…

    7- «Cada vez que a mulher de um Presidente da República cobre a cabeça perante o Papa ou um aiatola, (…) insulta a luta das mulheres ao longo da História, eternas vítimas da misoginia e do tribalismo patriarcal que as condenou ao sofrimento e à subalternidade. O véu na cabeça oca do adereço de um PR é um retrocesso indecoroso ao tempo em que às mulheres eram vedados todos os direitos. E é também um sinal de aceitação de que o cargo é um direito do macho.»

    Mirabile dictu!
    Eu já disse o mesmo, na secção de comentários do artigo anterior.
    E repito a hiperligação esclarecedora desse ato vergonhoso:
    http://www.jn.pt/pessoas/in/interior/a-razao-para-melania-e-ivanka-trump-usarem-preto-no-encontro-com-o-papa-8507593.html

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