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  • 11 de Maio, 2016
  • Por Carlos Esperança
  • Laicidade

“A minha liberdade acaba onde começa a dos outros”

Era o que faltava! Até ponho a coisa ao contrário. Só faltava que, para não ferir os meus sentimentos e as minhas convicções, não se pudesse dizer mal da República, do ateísmo e da social-democracia, v.g., ou recorrer à caricatura, à troça e ao sarcasmo!

Quando alguém apela ao respeito por determinada crença ou ideologia apenas pretende limitar a liberdade de expressão, dos outros, em relação ao que defende. Sei que ofendo alguém sempre que manifesto pontos de vista que divergem dos seus, mas não admito reduzir-me ao silêncio para não desagradar, sem deixar de ser amigo de quem quer que seja por divergências religiosas, políticas, filosóficas ou outras.

Quando se reclama respeito pelas convicções alheias apela-se à censura e mostra-se uma incomodidade com regimes democráticos e laicos. Uma peregrinação, uma promessa ou um ato litúrgico são tão passíveis de ser criticados quanto um comício partidário ou uma cerimónia fúnebre. Uma Igreja é tão merecedora de troça quanto um clube de futebol ou um partido político, embora saibamos que não é prudente gritar vivas ao Sporting junto da claque benfiquista ou ir cantar o credo romano para a porta de uma mesquita.
E, sobretudo, é uma provocação gratuita e idiota.

Em 13 de maio de 2008 a maratona pia a Fátima, presidida por um português, o cardeal Saraiva Martins, foi realizada sob o lema “contra o ateísmo”. Podia ser “pela fé”, mas o desvario místico preferiu uma preposição belicista. Os patrocinadores do evento tinham o direito de rezar contra a ideologia que condenam? Claro que tinham. Não recorreram a armas, não apedrejaram infiéis, não degolaram os concorrentes nem molestaram os indiferentes. Dezenas de milhares de terços disparados contra o ateísmo, o desfile bélico com velas acesas e as cantorias, de resultados duvidosos, foi o exercício de um direito.

Já devíamos estar curados de sensibilidades doentias que a ditadura legou. Há um único limite à liberdade de expressão, o que o código penal da democracia considere crime. O resto é vocação e devoção censória.

2 thoughts on ““A minha liberdade acaba onde começa a dos outros””
  • JoseMoreira

    Bom, a frase que dá o título ao artigo é, para mim, uma das frases mais idiotas que eu conheço. Porque as liberdades não começam nem acabam: complementam-se. Porque se eu tenho o direito de dormir a sesta, o meu vizinho tem o direito a fazer escalas de trombone.
    No caso em apreço, é evidente que os crentes têm todo o direito a rezar para acabar o ateísmo. Mas também é verdade que alguma coisa anda a falhar, porque o ateísmo está bem e recomenda-se.

  • João Pedro Moura

    CARLOS ESPERANÇA disse:

    “Sei que ofendo alguém sempre que manifesto pontos de vista que divergem dos seus”

    Não! Não se ofende ninguém, apenas por manifestar divergências críticas…
    Quem se poderá sentir ofendido são os difamados, pois que repudiam algo de mendaz, que os atinge na sua dignidade…

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