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  • 9 de Maio, 2013
  • Por Carlos Esperança
  • Laicidade

Crime, pecado e laicidade

Os meus leitores não precisam de explicações sobre a origem etimológica das palavras «ética» e «moral», conforme a origem, grega ou latina. A moral, por muito que nos doa, é a ciência dos costumes.

O homem é hoje mais tolerante do que o das cavernas e os sedentários mais clementes do que os nómadas. Não é por acaso que os deuses, criados em épocas recuadas, trazem a marca genética das tribos patriarcais que os conceberam.

Há alguns séculos ainda se engordavam mulheres para consumo humano e a escravatura era aceite. O direito de saque, incluindo mulheres, a tortura, as mutilações e execuções, e muitas outras barbaridades, eram morais e, pior, legais. Basta ler o Antigo Testamento para se ter uma ideia do cardápio de crimes que Deus consentia. Ainda hoje, a mutilação e os castigos corporais fazem parte dos códigos penais, sem esquecer pena de morte que países ditos civilizados ainda praticam. E não me refiro a países que fundem a religião e a política, aplicando a sharia, numa demência fascista de sabor medieval.

A igualdade de género, uma exigência ética, o mais elementar dos direitos, é tão recente (e ainda tão periclitante) que nos admiramos como foi possível suportar a iniquidade até aos nossos dias. E falem de igualdade de género em meios rurais ou em países poluídos pela tradição e pela fé!

A gravidade não reside tanto na injustiça cruel que a discriminação pressupõe como na implacável insânia de querer fazer do preconceito uma obrigação universal.

É aqui que entra o pecado. Abandonar uma religião para aderir à «nossa» é heroísmo e sair, para aderir a outra ou a nenhuma, é apostasia, o ato de traição punível com a morte, efetiva ou simbólica, conforme a evolução civilizacional e o grau de secularização.

É irrelevante que alguém acredite num ser hipotético que gosta de espiar pelo buraco da fechadura e abomina a sexualidade, mas é incrível que alguém ameace com as penas do Inferno e queira que os outros se verguem às suas crenças. O proselitismo é a lepra que corrói o espírito ecuménico que alegadamente tantos defendem.

Não é problema haver quem veja um pecado grave no consumo da carne de porco ou do álcool e abomine a heresia, a apostasia ou o sacrilégio, mas é horrível que essas crenças sejam impostas a quem as dispensa e se castigue quem as despreza.

Por urbanidade seria incapaz de ultrajar quem viaja de joelhos à volta de uma capela ou faz maratonas pias até chegar a um santuário onde a superstição localiza fenómenos de natureza transcendental, mas a fé não é um ato da vontade e há cada vez mais pessoas que não distinguem uma procissão do Senhor dos Passos do desfile da queima das fitas, a não ser pelo consumo de cerveja ou cheiro a incenso.

O adultério é reprovável, como qualquer ato de falsidade, e não se admite que o Estado o criminalize, mas Camilo foi preso por adultério e muitas mulheres foram mortas, sem castigo para os assassinos, pelos maridos que alegadamente traíam.
A laicidade, um conceito de matriz republicana, separou o direito penal do canónico. Já ninguém é penalizado (pelo menos, sob o ponto de vista legal) por considerar obsoletas as recomendações canónicas, falsos os milagres e um embuste a transubstanciação.

A laicidade separou o sagrado do profano. Os trinta artigos da Declaração Universal dos Direitos Humanos trouxeram mais felicidade do que todos os livros sagrados, de todas as religiões juntas, em todos os seus versículos.

O desejo de uma vida para além da morte é respeitável, se não tiver em vista a conquista de novos crentes e a fanatização dos que já o são. A transmissão de crenças às crianças reduz a liberdade e coarta o seu desenvolvimento harmonioso. É por isso que hoje, nas madraças e mesquitas, como ontem, nas igrejas e conventos, se criam fiéis capazes de morrerem e matarem, por um mito, em busca de rios de mel e de virgens que aguardam os delinquentes de Deus à chegada ao Paraíso imaginário.

A laicidade é uma exigência sem a qual não há democracia nem direito à dignidade e ao livre-pensamento.

29 thoughts on “Crime, pecado e laicidade”
  • Música Para Chanfrados

    Novamente, música para chanfrados no seu pior:

    http://www.youtube.com/watch?v=LHb6D4AuOIQ

    P.S. Dedicada aos chanfrados deste site.

    • Molcoh Baal

      Obrigado. Essa é gira.
      Já agora podes dizer qual é a música que nos autorizas a ouvir ?

      • Moloch Baal

        Para o fifi, que julga que faz figura de inteligente por insultar todos os que não gostem das mesmas coisas do que ele.

        Aqui vai uma dos Bathory, em honra dos antigos, nossos pais antepassados, que criaram um dos ramos da cultura europeia, muito anterior a essa moda recente, essa modernice chamada cristianismo.

        Father To Son
        (Father to Son
        Father to Son
        Father to Son
        From Father to Son)

        Now born my son I name thee
        After the sound of my Hammer’s
        Beat upon the anvil
        On this chilly springtime day

        The Hammerchild of my flesh
        Of my blood to carry on
        When I have reached Oden’s end
        Of my glorious warrior’s trail

        (From Father to Son
        From Father to Son)

        Call upon the spirits of our fathers
        Long time gone with thunder
        Ask them for truth and courage
        When trouble is in your way

        Learn to read and understand
        The signs to few can clearly vision
        Listen carefully to what
        The Ravens has to say

        Oh, hear the Thunder’s roar
        Greetings from our fathers long time gone
        Tell so that no one ever will forget
        What is in heart goes from Father to Son

        (From Father to Son
        From Father to Son)

        Oh, watch the lightning strike
        Feel the powers of the Hammer’s pounding on
        Take it to your heart and understand
        What must live on from Father to Son

        (From Father to Son
        From Father to…)

        Promise me my son to always
        Cherish what is home to you
        What is the truth and to
        Defend all of your race

        Never lose the values
        I have taught to you
        Always keep your moral and ideals
        Do never bring your flag disgrace

        (From Father to Son
        From Father to Son)

        Promise me my son before my corps
        Is turning pale to
        Grab my sword hold it to the sky
        And call out my hail

        Listen for the bronze horns
        Watch the lightning strike then
        You know I have reached Oden’s end
        Of my warrior’s trail

        Oh, my child please take heed
        Through you I am granted to live on
        These words more worth than you will ever know
        Make them live on from Father to Son

        (From Father to Son
        From Father to Son
        From Father to Son
        From Father to Son)

        [Dedicated to the Children of the North Star]

        6:25

    • stefano666

      essa musica é merda mesmo!! bom mesmo é musica gospel pra arrancar dinheiro das ovelhinhas!

  • provocador

    Ó Esperança, você hoje não se esqueceu de evocar as virtualidades da Revolução Francesa, estilo guilhotinas para todos os gostos, está a ver ? Lavoisier parece que foi um dos bafejados com essa época áurea da humanidade, as Carmelitas de Campiégne também. Outro momento muito épico e comovente foi quando, em plena república, o Napoleão se autocoroou Imperador.

    • Moloch baal

      Ó fifi, ao menos podias disfarçar a ignorância.
      Olha que grande parte dos responsáveis pelo Terror eram crentes.
      E o Napoleão autocoroou-se imperador, é verdade.
      O papa é que ficou todo chateado porque queria ser ele a coroá-lo.

      • Moloch Baal

        http://neilsilberman.files.wordpress.com/2010/01/napoleon-coronation.jpg
        Vês fifi ?
        O teu dono está sentado de plateia, a abençoar o imperador…

        • Moloch Baal

          Como teria abençoado Hitler e Estaline, se eles lhe têm passado cartão,

          • provocador

            Gosto tanto de te ver saltar ao som do meu comando, patarata. Toma lá para te entreteres, tótó:

            http://newsaints.faithweb.com/martyrs/MFR02.htm

          • Moloch Baal

            Sim fifi.

            Mas olha que os teus santarrões foram quase todos mortos por um crente – Robespierre.

            Que chatice teres de ir ler coisas à pressa, das quais não percebes nada, para ires respondendo, não é ?

            Para escapar, o melhor é voltar à tua velha táctica de copy pastares 500 páginas de Nitzsche, a propósito de nada que tenha a ver com o que está a ser debatido.

            É que fica sempre bem. Dás uma de intelectual e talvez ajude a esquecer bacoradas que provam que não passas de um grunho boçal, como a de insultares, de uma assentada milhões de pessoas só por apreciarem um género musical diferente do que tu gostas.

          • provocador

            Ó patarata, tens que te habituar à ideia que vivemos em democracia, ainda não tinhas reparado? A tua cultura primitiva ainda não te tinha permitido entender isso ? Tu gostas de Black Metal, não me admira nada, grunho nojento, o contrário é que seria para estranhar. Se um gajo, como tu, até coze as couves na água onde lava o cu, o que é que se poderia esperar de ti ? Que não gostasses de música de grunhidos, cuspo e violência ? Eu, por mim, não gosto de música de chanfrados, é um direito que me assiste. Demicracia estás a ver ?

          • Moloch Baal

            Estás mesmo histérica fifi.

            Claro que podes não gostar do que quiseres. E quanto a mim, estou-me a cagar para os teus insultos, caso contrário não vinha para aqui, onde crentes cheios de amor como tu, passam a vida a insultar e ameaçar toda a gente.

            A questão é o insulto, gratuito, de milhões de outras pessoas, como forma de exercício da tua ética, ou falta dela.

            O que quero dizer é que, o facto de não gostares, não implica que insultes quem goste.

            Ou foi o teu jesus que te ensinou a insultar quem não partilha os mesmos gostos ?

            Não sei porquê, mas não consigo encontrar o “insultai-vos uns aos outros” que tu pareces seguir tão fervorosamente.

            Não está entre aquela do dar a outra face, nem no amar o próximo.

            É estranho que, numa religião supostamente baseada no amor mais assolapado, os seus crentes geralmente só extraem ódio.

            Deve ser a tal vossa cena da “interpretação” dos textos ao contrário do que lá está escrito.

            Portanto, onde está escrito “amarás o próximo como a ti mesmo” deve ler-se “odiarás o próximo” etc.

          • provocador

            Olha quem fala, o ético, o gajo que andou aqui a insultar tudo e todos e que agora se vem armar em profeta da boa nova metálica. És um desgraçado, um pobre diabo armado em adorador de ídolos pagãos que não tem estaleca para receber críticas. Estavas mal habituado. Se tivesses um mínimo de vergonha, deitavas ao caixote do lixo esse nick horroroso de ” Moloch Baal”, o deusinho ao qual se ofereciam sacrifícios de crianças. É essa a tua ética, patarata ?

          • Moloch Baal

            Caro fifi.

            Eu nunca insultei ninguém gratuitamente, só por gostar de uma música ou de uma cor diferente.

            E depois, mesmo que insultasse, eu nunca fui mentiroso nem hipocrita dizendo que seguia uma filosofia do amor aos kilos por toda a gente como vocês fazem entre dois insultos a toda a gente.

            Estamos a falar da calma com que tu insultas não só os presentes, mas milhões de pessoas que não estão sequer a participar na conversa, nem têm nada a ver com isto, e ainda por cima bates no peito, clamando o teu amor pela humanidade e pelo teu próximo.

            Como é que vocês conseguem fazer na prática, sempre, exactamente o contrário do que afirmam que fazem na vossa propaganda ?

            Se não visse estas vossas figuras nem acreditava, pensava que era exagero dos ateus.

            É um verdadeiro milagre.

            O milagre da multiplicação geométrica da hipocrisia numa escala verdadeiramente monstruosa.

            Vocês têm qualquer coisa de diabólico.

            O black metal, ao pé do cristão conservador médio, é uma brincadeira de crianças.

          • David Ferreira

            Não se esqueça de o informar que existem diversas bandas de Black Metal cristãs, com letras de cariz cristão. Assim como muitas bandas de Heavy Metal e Rock cristãs. O importante na música não é a mensagem lírica que pretende transmitir. É a música em si e o que ela faz sentir a quem a ouve.

          • Moloch Baal

            É verdade que existe de tudo no metal, como em toda a parte. Mas a corrente principal não é cristã, andando pelo simbolismo pré-cristão da nossa cultura antiga.

            Eventualmente interpretado como satanismo ou paganismo, a simples utilização desses símbolos prova que significam algo na nossa cultura.

            Quanto à liricas não interessarem para nada, discordo.

            Uma obre de arte é feita de todas as suas partes componentes, e a mensagem, sem dúvida que é uma delas.

            Podem não significar nada para si, que não se identifica com determinados valores, mas, para quem se identifica obviamente que significam.

            Se não fosse isso, porque não uma boys band com suasticas e uniformes das SS, hinos a Hitler e ao holocausto, só porque achassem bonito ?

            Evidentemente que a mensagem importa e não é pouco.

          • Moloch Baal

            Caro Ferreira, o que você estará a confundir é a possibilidade de se apreciar uma obra de arte, mesmo que a sua mensagem nada nos diga, com a suposta insignificância da mensagem.

            A arte sempre foi um veículo de transmissão de ideias, nunca foi um receptáculo vazio.

          • David Ferreira

            Isso depende da maneira como se interpreta a arte. Como tudo na vida.
            Claro que muita da arte é um meio de transmissão de ideias. Mas a arte é muito melhor interpretada como um meio muito próprio de o artista de interpretar os seus sentimentos perante a vida e a realidade. O que a arte tem de maravilhoso é que, independentemente da mensagem que é suposto passar, é algo que está sempre sujeita à interpretação de quem a apreende. A mesma mensagem é interpretada de diferentes maneiras por diferentes pessoas.

          • Moloch Baal

            Mandamento REAL dos cristãos conservadores;

            Odiarás o próximo com todas as ganas e usarás de todos os pretextos para o insultar.

          • provocador

            LOl…andas desesperado…

          • Moloch Baal

            A tua argumentação não estará um bocado fraquita ?

            Não estará na hora de copypastares 500 páginas
            de Nitzsche para disfarçar ?

          • provocador

            LOL…andas mesmo taralhoco de todo…pareces uma barata tonta..

          • Deusão

            …e tomar o dinheiro dele e todo o que ele possuir…
            Tudo em nome do amor de xeçuis, meu filhinho palerminha.

          • Deusão

            Então agora respeita a democracia ?
            Certamente respeita a decisão do povo português sobre a interrupção voluntária da gestação, certo ? Ou , como todo crente, só respeita as decisões coletivas quando estas lhe é conveniente ?

    • stefano666

      de fato a revolução francesa aprontou… a exemplo de tua santinha igreja

  • Ah Pois

    Vejo que o Carlos Esperança já começou a preparar-se para “botar

    faladura”, durante vinte minutos, lá para os lados de Miranda do Corvo.

    Gostava imenso de me rir, mas não posso ir a Miranda do Corvo.

    Se a dita palestra versar o conteúdo desta narrativa, imagino o riso, ora despregado ora cortesmente contido (num misto de caridade e educação).

    “A moral, por muito que nos doa, é a ciência dos costumes.”

    Não dói nada, mas as coisas não são assim tão simples. Veja lá, caro Esperança, se a plateia de Miranda do Corvo lhe sai mais exigente do que espera.

    Recomendo-lhe que repense e repasse estas noções.

    Cá fica uma achega:

    “Moral” deriva do latim, de “mores” (costume).
    Mas, atenção! “Moral” também se traduz por “institutum”, e ainda por “disciplina”… entre outras coisas.

    É necessário ter tanto cuidado com as generalizações como com os estereótipos. Escutei dizer-se que o ateísmo é satânico. Não vá o diabo tecê-las ou revoltar-se contra o seu fiel seguidor…

    Se não quiser ser ridicularizado, não leve ao púlpito afirmações ridículas como esta: ” seria incapaz de ultrajar quem viaja de joelhos à volta de uma capela”. Pode levantar-se alguém da plateia, não para entoar o “Grândola vila morena”, mas para lhe citar expressões cuja autoria lhe cabe e que desmentem tão “civilizado” propósito que diz possuir.

    Será, por certo, considerado um bom comediante se afirmar que “a laicidade [é] um conceito de matriz republicana”, ou que “a laicidade separou o sagrado do profano”, e que depois ligue falta de laicismo a “demência fascista”, quando o fascismo e os restantes regimes totalitários do século passado são republicas.

    Dizer que a religião “abomina a sexualidade” não é heresia, mas é uma forma de néscio disparate, pois as religiões chegam a impor a sexualidade.

    E tantos outros exemplos…

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