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Democracia e laicidade

Quando convém, a nossa comunicação social, em geral, e os nossos políticos em particular, enchem a boca de democracia e laicidade. E são capazes de jurar a pés juntos e com um prego aceso na mão que Portugal é um estado democrático e perfeitamente laico, não tendo o menor pejo em invocar a Constituição como a principal e melhor testemunha.

Entendamo-nos. É tudo uma questão de rigor linguístico – ou de falta dele. Porque omitem uma palavra que, apesar de pequena, faz toda a diferença. É um singelo advérbio e modo que dá pelo nome de formalmente. Exacto. Portugal é um país formalmente democrático, e formalmente laico.

Em Portugal, a justiça é igual para todos, ninguém está acima da Lei, a saúde é tendencialmente gratuita  e a educação é mesmo gratuita, toda a gente tem direito ao trabalho. Formalmente falando, claro.

Em Portugal, a religião está separada do Estado. Formalmente. Porque a prática diz-nos, precisamente, o contrário. A TV do Estado, de todos nós, encheu-nos o Domingo com as Festas de Barcelos, o que até nem seria grave, se não fizessem o patético esforço de tentar justificar a origem das festas, enchendo o tempo com estórias cuja veracidade está a anos-luz da razão. Mas isso ainda é o menos; porque ao fim da tarde, a dita “primeira-dama”, esposa de um presidente de uma república dita laica, aparece no meio de uma procissão religiosa cuja única finalidade visível é a de aproveitar o sol para tirar o cheiro a mofo do mamarracho, e tentar aliviar-lhe o caruncho. E tivemos de gramar largos minutos, como se o folclore tivesse alguma importância para o momento que o país atravessa.

Tudo isto, afinal, a propósito do nome do futuro hospital de Lisboa. Que, num país laico, vai chamar-se “Hospital de Todos-os-Santos”. Mas o que é que têm os santos a ver com os hospitais de um estado que se diz laico? Já agora: vale uma aposta em como vai levar benzedura?

Portugal, país laico e democrático? A língua portuguesa é mesmo muito traiçoeira…

4 thoughts on “Democracia e laicidade”
  • rtt

    O Estado é laico, o país é que não é nem teria que ser.

    Quanto a democracia… duvido que seja. Num regime onde o povo, onde quem dita os destinos do país não foi eleito nem será nunca sufragado, chamar a isto democracia é uma figura de estilo, ou então é uma ofensa.

    No que respeita à “TV do Estado, de todos nós…”, esta observação é um perfeito disparate. O Estado laico respeita aos Órgãos institucionais do Estado e às suas decisões. Não respeita a empresas e ou instituições que estado administre ou coopere. No caso da TV, não dar espaço ao fenómeno religioso seria, até, a forma de comprometer ou negar as obrigações do estado laico.

    O estado laico terá de o ser no exercício da soberania das suas instituições, mas não pode impor a laicidade à coisa publica que nós partilhamos, pagamos e temos o direito de usufruir.
    Por isso mesmo, as mais recentes decisões de organismos jurídicos internacionais não validam a obrigação de retirada de símbolos religiosos das escolas, hospitais, etc.

    Aí o Estado é o empresário e não o Órgão administrante do pais.

    • Moloch Baal

      “O Estado laico respeita aos Órgãos institucionais do Estado e às suas decisões. Não respeita a empresas e ou instituições que estado administre ou coopere. ”
      Querias !
      Já agora, um fanático religioso que tomasse conta da administração de uma empresa publica, poderia despedir todos os funcionários que não pertencessem à seita e só prestar serviços de empresa aos seus acólitos.
      Está-se mesmo a ver.
      Era bom não era ?
      Mas as regras de respeito pela neutralidade do estado aplicam-se a todos os seus órgãos, ramos e actividades, sejam eles quais forem.
      Quando não se aplicam estão a violar ou a letra ou o espirito da lei.

  • Milba

    “O presidente da comissão, deputado Décio Lima (PT-SC), prepara discurso para defender a aprovação da proposta.

    — (CITE-SE: SUBMETER O STF AO CONGRESSO — essa é a “proposta”: tipo, NÓS ROUBAMOS E NÓS PRÓPRIOS NOS ABSOLVEMOS, se a Justiça nos condenar) —

    Ele avalia que a matéria, de autoria do deputado Nazareno Fonteles (PT-PI), não viola a Constituição e enxerga excessos na condução da episódio.

    — (CITE-SE: Esse “dePUTAdo” é um meliante que cismou ainda há pouco de torturar as mulheres com a questão do aborto).–

    A inclusão na pauta e a aprovação da emenda teve o aval majoritário do PT de São Paulo, que tem sete integrantes no colegiado. Entre eles estão dois condenados no mensalão que integram a CCJ: José Genoino e João Paulo Cunha. Genoino, inclusive, participou da votação. A matéria entrou na pauta pela primeira vez em dezembro, pelas mãos do então presidente da CCJ, Ricardo Berzoini (PT-SP).”
    — (Este também envolvido e livrado dos processos de corrupção).–

    Os trechos de noticiário são do Jornal Correio do Povo de Alagoas (menos os em travessões).

    Como vêem, vão botar o Brasil numa masmorra com um “formato” de monarquia-TEOCRÁTICO-ditatorial cuja lei será a CORRUPÇÃO.

    Na Comissão dos Direitos Humanos foi botado lá um racista, homofóbico, pastuto, enganador e estropiador de pobres.

    Qual é a nossa valia como cidadãos civis? Vamos deixar tomarem nossas vidas como se fôssemos franguinhos de galinheiro?

  • provocador

    No sentido geral, este texto do José Moreira é pertinente. Não é nada habitual concordar com ele, mas aqui reconheço que ele tem razão. Apesar de a laicidade de um estado não se confundir com a realidade sociológica de um país, entendo que é justo encontrar-se um ponto de equilíbrio entre a laicidade estatal e a não laicidade da sociedade civil. Portugal é um país com larga maioria de crentes e com uma tradição católica preponderante, que eu, enquanto não católico, respeito. No entanto, também me parece que, para um hospital público, seria mais curial ser referenciado por outra designação mais neutral, que não a do Hospital de Todos-os-Santos. Por outro lado, também discordo que, nos edifícios públicos, como hospitais, escolas ou tribunais, estejam colocados quaisquer símbolos religiosos. Penso que, nesses dominios públicos, o estado português deve efectivamente abster-se de sancionar uma qualquer preferência de carácter religioso.

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