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  • 16 de Agosto, 2012
  • Por Carlos Esperança
  • Ateísmo

O MEU ATEÍSMO

Por

ONOFRE VARELA

Já confessei aqui que não sou (ou não era) um atento leitor, nem frequente visitador, deste site sobre Ateísmo. Isso acontece porque os computadores não me atraem e sou informaticamente analfabeto por vontade e conta própria. E embora faça parte dos órgãos sociais de quatro associações (duas de arte, uma de jornalismo, e mais a
Associação Ateísta Portuguesa, cujo movimento para a sua formação iniciei no Porto em 1997), também confesso que as actividades associativas, bem como as empresariais ou políticas, ao nível directivo, não me cativam. Não tenho jeito para líder, nem para balir como cordeiro em redil.

Prezo muito a minha liberdade de acção, de pensamento e de expressão, e talvez este modo de estar na vida seja a consequência de sempre me dedicar às artes (sou pintor, ilustrador, caricaturista e cartunista, para além de escrever em jornais [escrevi e desenhei em todos os jornais do Porto desde 1969 até 2000] e já ter publicado meia dúzia de livros) cuja “praxis” é individual e solitária.

Mas, há dias, dei uma volta pelo arquivo deste portal e li o texto “Porque Sou Ateu?”, de Jaime Gralheiro, publicado em 16 de Julho último. Deste autor já li excepcionais textos, noutras fontes, e recomendo a releitura atenta das suas razões a quem, de religiosidade, de ateísmo e de Humanidades, tiver uma visão séria, e não se fique pelas picardias — que também li nos recados de rodapé do excelente texto que refiro — que denotam um total desrespeito boçal e ignorante, pelo homem de cultura que é Jaime Gralheiro.

Do seu sincero e humilde texto ressalta esta verdade incontornável:
O ateu faz-se, não só porque pensa (os religiosos também pensam, por suposto…), mas principalmente pela especial excelência do seu pensamento.

(O ateu que se faz por si próprio, é de melhor qualidade do que o ateu induzido. Este, será igual [em sentido inverso] ao religioso que sai do aviário da catequese). O acto de pensar, para além de ser subversivo, pode ser comparado com o gosto pela música: há quem se fique pela adoração do Marco Paulo e da Ágata, e há quem prefira Zé Mário Branco e Manuel Freire!
Quer dizer: há o pensamento “pimba”, e o outro!…

Num plano mais elevado de pensamento, subimos degraus até Bach, Haydn, Chostakovich, Richard Wagner, Boccherini… e passamos pelos mestres da casa, Emmanuel Nunes, Victorino de Almeida, Fernando Lopes Graça, Carlos Paredes…

No mundo da Religião temos aqueles que pensam ao nível de Bach, mas a esmagadora maioria dos peões-militantes-de-base, que são os alimentadores da mesa farta dos melómanos Bachianos, não passam do nível… Quim Barreiros!

Alguns dos meus amigos ateus começaram por ser religiosos, tal como Jaime Gralheiro confessa, embora outros nunca tenham entrado numa igreja com espírito de crente por não terem sido contaminados em meninos.
E é nessa contaminação que reside o problema, e a diferença!…

A minha história de ateu começa pelo importante facto de os meus pais nunca me educarem na filosofia religiosa, mas no comportamento ético do respeito pelos outros e pela Natureza, impedindo a Igreja de me agrilhoar a mente, como faz aos cérebros tenrinhos. Estou eternamente grato aos meus pais, também, por isso.

Devo dizer que não fiz a comunhão, por um triz e por acaso! O meu pai, que nasceu em 1912, foi influenciado pelo anti-clericalismo da primeira República, mas não era fundamentalista e deixou à minha vontade fazer, ou não, a aprendizagem do Catecismo Católico, quando eu teria doze ou treze anos. Essa história conto-a no livro “O Peter Pan
Não Existe”, (Caminho, 2007) pág. 178 e seguintes.

Na adolescência não alinhava em missas, nem me considerava ateu ou agnóstico. O fenómeno religioso era-me indiferente. Passava-me ao lado vertiginosamente. Já estava incorporado no Exército quando comecei a pensar com mais qualidade na história de Deus e no hábito religioso dos meus camaradas, e tudo isso foi motivado pelo discurso de um padre militar, alferes-capelão.

Ser militar não era coisa que estivesse nos meus intentos, mas foi uma inevitabilidade a que não soube fugir. Naquele tempo a juventude tinha a vida parada, no mínimo, por três anos (no máximo, ficava estropiado ou morria) por causa do conflito armado com as Colónias, e muitos recusaram servir o Exército de Salazar e, clandestinamente, partiram para França e por lá ficaram, evitando, desse modo, participar na Guerra Colonial com a qual não concordavam.

A minha passividade reteve-me por cá, obrigando-me ao cumprimento do serviço militar obrigatório. Não declarei as habilitações académicas (3º ano de pintura) por recusa de dar o melhor de mim à ditadura de Salazar, e fui soldado raso, condutor. (De nada valeu esta minha repulsa pelo Exército, porque quem é portador de algo para dar, dá-o mesmo sem querer. No meu primeiro embate com a disciplina militar, fui condenado a quatro dias de prisão, que cumpri. E de África acabei por trazer três louvores!… Mas isso são contas de outro rosário).

Um dia, no quartel CICA 1, Porto, recebemos a visita do alferes-capelão e ouvimos o seu discurso. Estava ali para nos dar bons conselhos, disse ele. Já não recordo o teor da sua palestra, mas suponho ter sido semeada pela religiosidade alimentadora do espírito
de qualquer sacerdote, católico ou não, com a habitual e inabalável atitude de fé num deus supremo. Mas recordo o modo como ele rematou aquela sua apresentação, porque o registei numa espécie de diário que então fazia.

Disse-nos que devíamos seguir “um caminho certo” e “praticar o bem”, completando os seus anunciados conselhos com esta enigmática frase:
“Façam sempre o que a vossa consciência manda”.

Para mim era impossível ouvir aquilo e não reflectir… e ali andava surrealidade!
Imediatamente antes de aqueles recrutas entrarem naquela sala, tinham acabado de receber instrução de armamento, e uma arma é um objecto fabricado com o propósito de matar. O discurso do sacerdote teve como ilustração de fundo o som dos disparos que nos chegavam da carreira de tiro, os quais tinham o objectivo de apurar a pontaria para, na guerra, não se desperdiçar munições e ser-se certeiro na liquidação do inimigo. Cada tiro deveria corresponder a um cadáver.

Para além disso, não pertencíamos ao Exército de um governo democrático que, em princípio, usaria as armas na defesa de causas nobres. Não! Nós prestávamos serviço num quartel das Forças Armadas de um país que tinha um governo ditatorial, anti-democrático, e que alimentava uma guerra colonialista em África, contra os povos que
reivindicavam independência.

Era esta a surrealidade que emoldurava a presença daquele padre com discurso moralista no quartel (!?), como se houvesse moral que se aproveitasse, na acção bélica daquele exército!… Em tal contexto, o que é que se devia entender por “caminho certo?” E “praticar o bem”?! Será certo, e bem, pertencer ao exército de um ditador?
Será certo, e bem, partir para uma guerra colonial, lutando contra os povos que pedem a independência? Como pode um soldado fazer sempre o que “a sua consciência manda?”

Os exércitos obrigam a uma “consciência colectiva”, onde o indivíduo não é respeitado como tal, e recrutam jovens imaturos destituídos de consciência crítica. Aquele padre estaria a tentar dizer-nos que quem não concordasse com a política do governo colonialista não deveria, em consciência, estar ali? Estaria a incentivar a deserção e a rebelia?! E ele? Porque estava ali? Porque não desertava?!

A sua consciência estava tranquila e harmonizada com a situação política do país, que as Forças Armadas defendiam e ajudavam a manter? Na sua consciência não lhe pesava o facto, nem o fardo, de servir nas fileiras do exército de um ditador? Ou navegava contra-a-corrente e tentava, camufladamente, alertar-nos para a política de que estávamos distanciados?!…

O seu discurso não passaria de um conjunto de palavras de circunstância, no fingimento de, ao serem ditas por um sacerdote católico, serem exemplo de uma autoridade moral? Será que eu entendi mal o seu recado, transformando-o na lógica do meu pensamento cívico e arreligioso?…

Numa palestra posterior o padre acabou por destruir a boa imagem que eu estava a construir de si imaginando as suas intenções subversivas secretas a partir do seu discurso que, de algum modo, me parecia revolucionário. Dessa vez disse-nos:

— Deus vê-nos e escuta os nossos mais secretos pensamentos, portanto devemos pensar e executar só o bem… e, até, devemos dar a última gota de sangue, dar a nossa vida, pela Pátria… (!?)

Desilusão!… Senti-me traído por aquele sacerdote, e deixei de prestar atenção ao seu discurso que se revelou tão infantil… tão ao estilo de história da carochinha e do Pai Natal, em contraste com o outro que me pareceu ter “miolo”! Lembrei-me imediatamente daquela anedota do Zéquinha, a quem o padre disse que devia portar-se bem porque Deus estava sempre ao seu lado testemunhando as suas acções. Intrigado, o Zéquinha perguntou:

— Deus também está ao meu lado quando brinco no quintal da minha avó?
— Claro que sim, meu filho…
— Ora, vá-se lixar… a minha avó não tem quintal!…

Esta infantilidade anedótica do alferes-capelão, passei a detectar em todos os discursos de padres, a partir daquele dia! Nas igrejas onde assisto a casamentos, a baptizados e a funerais, mas também nas palavras de bispos e de papas, difundidas pela imprensa, pela rádio e pela televisão, e ainda nas palestras ridículas e vigaristas das seitas ditas cristãs (tão ridículas e vigaristas como as católicas, mas com nuances), em espaços televisivos e radiofónicos. (Se Jesus Cristo tivesse sabido do lindo serviço que fazia, tinha ficado quieto e caladinho e não havia milagres para ninguém!… Isto, se acaso a figura histórica JC existiu realmente, para além do mito sobre o qual foi, estrategicamente, construído o Cristianismo!… O que não é totalmente claro).

Parece-me que todos os padres falam para uma assistência de criancinhas de infantário, ou para adultos com um considerável atraso mental, colocando-os ao nível dos putos de cueiros! Se eu ouvisse esses recados religiosos desde o berço, o meu cérebro tinha sulcos, abertos como caminhos, por onde escorriam os recados religiosos transformados em “inegáveis verdades”. Mas quando se ouve desses recados, já com cérebro adulto, o crivo do sentido crítico funciona e não deixa abrir caminho por aí, porque já se percebe que esse não é o caminho.

Por essa razão é que a ICAR e o Islão teimam em “educar” as criancinhas na sua estética religiosa, sulcando os seus cérebros com um arado diabólico, semeando-o de mitológicos santos e demónios, impedindo que os seus intelectos amadureçam com qualidade. É assim que se fabricam soldados para alimentar o exército de religiosos, e assim queria fazer o actor Tom Cruise, recentemente, ao cérebro da sua filha, na seita Cientologia, mas a mãe da criança teve a sensatez de o impedir (mais uma vez agradeço aos meus pais o terem-me poupado a essa maldade).

O deus que espia no quintal de quem não tem quintal… e que condena à morte o seu amado filho-proveta… para nos salvar (!!??…), não pode ser coisa séria, nem convencer ninguém que pense e que não ouça Quim Barreiros!…

A experiência militar que me esperava nas matas dos Dembos, no norte de Angola (Dez. 1965 – Fev. 1968), foi trágica e mostrou-me a presença constante da morte. O medo pavoroso que sentimos pela irremediável morte, é o grande responsável pela sedimentação das crenças religiosas. Todas elas pretendem fintar a morte, propagandeando uma outra vida para além dela. É este o segredo do marketing religioso: aceitar a morte como passagem para o “reino de Deus” onde se desfrutará de felicidade inaudita! E a alma, que é etérea — logo, destituída de sistema nervoso — quando é enviada para o inferno, sofre abundantemente!… Mitologia pura, deglutida até à última garfada pelos religiosos seguidistas, incapazes de criticarem a ementa que lhes é servida em chip cerebral.

Nas matas dos Dembos vi de perto camaradas caídos em combate, e ajudei o médico numa autópsia. A morte rondava a cada hora de cada dia, e passei noites debaixo de fogo. Perante aquela situação de desespero prolongado, percebi a necessidade que os meus camaradas tinham de consumir o produto-droga-Deus, na procura de um conforto para as suas angústias. Assistiam fervorosamente às missas campais, movidos pela tal promessa de vida eterna, e na presunção de que se adorassem Deus e lhe rezassem com frequência desmedida, estariam protegidos em combate!

Conversei com camaradas protestantes que me diziam assistirem às missas católicas por ser “o sítio do encontro com Deus”. Compreendi todas as suas motivações, mas nunca senti necessidade delas. O que senti, isso sim, foi desconforto por ser o único, de entre os jovens militares que ali esperávamos o correr do tempo para regressarmos às nossas famílias a salvo, que não alinhava em conceitos religiosos. Não tinha ninguém com quem pudesse conferir os meus pontos de vista contra-a-corrente !…

A constante presença da morte não era agradável, mas era uma condição natural da vida, embora ali o drama do fim prematuro fosse ampliado pela situação de guerra, o que, certamente, valorizava o sentido religioso dos meus camaradas de infortúnio. O conceito de Deus estava nas suas cabeças, mas não na minha. Não havia deus algum que desviasse uma bala que viesse na minha direcção, e essa era a realidade científica que a fantasia de Deus não alterava. A diferença estava na qualidade do meu pensamento, e na qualidade do pensamento de todos os meus camaradas.

Era a tal questão da música !… Chostakovich ou Quim Barreiros ?… (Na altura, era mais Ray Charles ou Roberto Carlos ?). Percebi a infantilidade das suas crenças, e passei a interrogá-los sobre a sua fé, começando aí a fazer a minha colecção de conceitos
religiosos, com espírito de aprendiz de Antropologia. Não negava as suas convicções, nem os incentivava a prossegui-las ou a deixá-las. Só queria saber como era. Motivava a conversa como ignorante que era nas coisas que à “razão” da fé pertenciam, ouvia, aprendia e armazenava.

Assim fiz quando, em 1968, regressei à vida civil. Movido pela curiosidade religiosa que a experiência militar me proporcionou, obriguei-me a ler a Bíblia, a Tora, o Corão e textos budistas (Udãna, la Palabra de Buda. Barral Editores, 1972). Passei a frequentar missas católicas, com atenção e intenção crítica, conversei com padres e percebi o funcionamento do culto. Li filósofos e ensaístas. Os clássicos Feuerbach, Shopenhauer, Hobbes, Kant, Espinosa, Nietzsche… mas também o Catecismo Católico, Santo
Agostinho, David Hume, Pascal, Pierre Teilhard de Chardin… e mais Sartre, Roland Barthes, Bertrand Russel…

Tudo isto fiz durante um período de cerca de 25 anos, com sentido antropológico, numa atitude de aprender o comportamento humano perante o fenómeno religioso, e não animado de espírito guerreiro ao serviço do “anti-Cristo”, nem, tão pouco, na “procura de Deus”, do que não necessito absolutamente e em definitivo. Nem, ainda — como se vê pelo tempo dilatado —, com interesse de tirar um curso apressado de Religião, ao estilo dos cursos de Miguel Relvas!…

O fenómeno religioso, embora me interesse culturalmente, nunca constituiu matéria de extrema importância para a minha vida. Não é daí que eu tiro o meu sustento, apesar de me sentir bem lendo, pensando e escrevendo sobre o tema, e sempre fui muito passivo perante as religiões e as opiniões dos religiosos. Só me afirmei ateu, convicta e conscientemente, quanto já contava mais de 40 anos de idade. Mantenho-me tolerante, mas, às vezes (muito raramente), “salta-me a tampa” e assumo um discurso não habitual em mim, que não é antropológico do ponto de vista científico, mas que descamba mais para o estilo Gil Vicentino! Não sou santo e já não tenho idade nem paciência para aturar insolentes.

Hoje, perante o facto de um licenciado (médico, por exemplo) encarar o conceito de Deus com a mesma religiosidade demonstrada por um servente de pedreiro analfabeto, continuo a interrogar-me: Será que o licenciado não aprendeu nada, ou o analfabeto sabe muito?!…

Na verdade, crença e conhecimento (crer e saber) são matérias que não cabem no mesmo saco. São como água e azeite. Não se misturam nem têm índole semelhante. São, até, antagónicas, como o são os polos magnéticos. Repelem-se. Mas a primeira pode encontrar-se em cabeças recheadas com a segunda… quando se bebe da taça religiosa até ao fim, em catequeses e missas, na meninice!

Espanto-me com a recusa, ou incapacidade, que esse indivíduo intelectualmente superior tem, de apartar o mito do real! Acaba por fazer uma salada com ingredientes que não ligam! O resultado dessa experiência culinária, só pode ser… uma estupidificante diarreia mental !…

De facto o cérebro do Homem é complexo… e a música também. E a culinária… já agora !…

A religiosidade também pode ser manifestada em idade adulta, por quem não teve iniciação em criança, o que é mais raro mas acontece, e eu conheço um caso. Cada indivíduo, quando é dono da sua consciência, trilha caminhos próprios, motivados no seu querer e pelo seu crer. São interesses sempre iniciados por algo que vai funcionar como espoleta.

Na política aconteceu o mesmo depois do “Verão quente” de 1975. Filhos de comunistas, em regiões marcadamente de esquerda, filiaram-se no CDS. E alguns pais da ala mais direitista do espectro político da jovem democracia portuguesa, viram os seus filhos a militarem no PCP! A rebeldia contra o poder e a autoridade dos pais, pode criar destes fenómenos sociais, na política e na religião.

Obviamente (porque, realmente, não sou antropólogo, e não obstante a minha tolerância) não me coíbo de criticar costumes da Igreja, e de seitas religiosas que nascem como cogumelos em estrumeira para explorarem o sentido religioso dos mais despossuídos de tudo: de dinheiro, de sentido crítico, de qualidade de pensamento e de vida… e do resto.

Exploração que confirma o facto de Deus ser a pior invenção do Homem, porque tem, na subtil clonação das mentes, um dos aproveitamentos mais maldosos das religiões, criando “batalhões” que se servem de Deus para explorarem, chularem, sugarem e vigarizarem os crentes, que são, sempre, as vítimas culturalmente mais indefesas…

E isso devia constituir crime.

Onofre Varela

16 thoughts on “O MEU ATEÍSMO”
  • cínico

    Não gosto, mas não gosto mesmo dos textos, chatos e enfatuados, do Onofre Varela. Este, por exemplo, é um misto de salada russa e de monólogo auto justificativo e pedante. Ele é o indivíduo que lê não sei quantos autores, que recebeu não sei quantos louvores e que termina habitualmente os seus extensos ” lençóis” com aquela tirada estupidificante de ” Deus ser a pior invenção do Homem”. O Varela pode e deve falar de tudo quanto reprovável ocorreu em nome de Deus. Disso tudo também eu falo e sou crente. Reprovo os livros abjectos como o Deuterónimo, o Levítico e o Êxodo, verbero os papas e clérigos corruptos e sexualmente pervertidos e abusadores.Indigno-me com a iniquidade das Cruzadas, da Inquisição e o genocídio dos Cátaros. Deploro a superstição fatimista anti-cristã. Mas acredito em Deus, numa linha mais aproximativa à visão deísta de Einstein e à de todos os místicos, de todos os tempos, que sempre intuíram Deus como Amor e Bondade.Do Cristianismo, continuo a afirmar que Jesus Cristo introduziu um novo paradigma ético, numa época tão tormentosa, intolerante e iníqua, como foi aquela em que viveu e morreu. Há certamente muitos elementos nos Evangelhos que me suscitam perplexidade, como o relato do endemoninhado geraseno ou a sua falhada previsão do fim dos tempos. Mas digo-o sinceramente: se não fosse crente, se fosse ateu ou agnóstico, seria igualmente cristão e rever-me-ia num ponto fulcral de toda a Doutrina de Jesus de Nazaré: a censura da Lei de Talião. O episódio da mulher adúltera é bem revelador dessa enorme coragem e sentido ético de Jesus de Nazaré. Essa mulher, se a lei moisaica tivesse sido aplicada, teria sido lapidada.Hoje, alguns filósofos ateus, como Terry Eagleton, André Comte Sponville, Alain de Botton ou Slavoj Zizek, afirmam, com argumentação que plenamente acolho, o carácter eminentemente progressista de Jesus de Nazaré. E, no caso de Sponville e de Zizek,estes confessam-se claramente ateus cristãos, certamente por reconhecerem que, não obstante a descrença na divindade de Jesus, ele trouxe ao mundo edificantes lições de generosidade e de compaixão pelos sofrimento alheio. Esse é o único Jesus de Nazaré, de que me interessa falar. E é aquele que tem sido coerentemente evocado por homens como Francisco de Assis, Helder da Câmara, Óscar Romero, Leonardo Boff, Maximilian Kolbe, Aristides de Sousa Mendes e mulheres como Edith Stein ou Simone Weill.Em todos eles, Deus foi evocado como referência ética dos seus generosos comportamentos. Não certamente a visão sectária de Onofre Varela quando, mais uma vez, aqui reedita apenas a perspectiva que lhe interessa, de uma forma intelectualmente mesquinha e deplorável. Se ele leu tantos livros como afirma, tinha a obrigação de saber que não há uma única concepção de Deus. Nem sequer seria necessário o conhecimento dos Evangelhos e da Bíblia para alguém poder evocar uma concepção benévola, generosa e altruísta de Deus, como sempre aconteceu desde tempos imemoriais. Só para citar dois exemplos, evoco o maravilhoso Bhagavad-Ghita e os textos dos místicos sufis. São dos livros e textos mais belos que já li.E ,neles,a ideia de Deus remete para uma permamente ideia de Bondade e Compaixão. O Varela não conhece esses livros e esses textos, ele que se gaba de ter uma biblioteca de mais de 10.000 livros ? Nunca leu também os Vedas e os Upanishads ? Só conhece a visão mesquinha de Deus que lhe interessa, para este deprimente exercício intelectual a que constantemente se exercita? E também já se esqueceu da sua própria frase, sustentando que, em África, são os missionários católicos ou cristãos a única esperança para os povos famintos e marginalizados ? Então, nesse domínio, Deus continua a ser a pior invenção do Homem, Varela ? Uma última nota final: o Varela vai ter que meter na cabeça, pelo menos no que me respeita, que não há ninguém, neste mundo, ninguém, que esteja acima de qualquer censura.Nem ele nem qualquer Jaime Gralheiro.E sempre que eu entender justo aqui dizer o que me aprouver, ainda que isoladamente ou sujeito a todos os tipos de entraves ou insultos, pode bem estar certo que irei sempre, mas sempre, afirmar o que muito bem me apetecer.

    • stefano666

      “Em todos eles, Deus foi evocado como referência ética dos seus generosos comportamentos.”

      Você é bom em anedota… leia a Biblia.. os 2 testamentos… Deus é tao cruel que um Hitler da vida parecer um ladrãozinho de galinhas

      • Ateu sim, e daí ?

        O que mais me surpreende nessa gente é a capacidade de acreditar ou mais que isso, idolatrar e adorar um livreco fantasioso, cheio de tretas e que ninguém, absolutamente ninguém, sabe quem escreveu.
        Surpreende também as interpretações dos padres e pastores da “obra” ( obra aqui é a obra que fazemos na casinha ) e os crentóides aceitam. Se o pastuto dizer que só vai par o céu quem comer merda, os caras vão se empanturrar de merda – e sem a mínima crítica. Não vão querer nem mesmo um pouco de sal ou azeite para melhorar o sabor.

    • stefano666

      é uma hipocrisia voce citar Romero… quando este foi vitima de expurgo promovido pela ditadura do pais dele.. o papado foi conivente com esse expurgo porque ele era um obstaculo pros imundos intere$$e$ papais em El Salvador.

    • Pitonisa

      Ai Nandinho, meu querido, cada vez gosto mais de si! A delicadeza e a frontalidade com que você desanca nos ateus, é notável – a todos os títulos, entenda-se. Você não consegue contrariar uma única linha do texto, mas malha do Varela que é um máximo! Depois, a sua coerência: não há escrito seu que não fale em Jesus de Nazaré, Enver Hoxa,
      Francisco de Assis, Helder da Câmara, Óscar Romero, Leonardo Boff, Maximilian Kolbe, Aristides de Sousa Mendes e mulheres como Edith Stein ou Simone Weill.
      Mas olhe, meu querido, aqui, nesta parte do globo, o único deus oficial é aquele que ven na Bíblia. O tal de quem você não gosta, lembra-se? O outro deus, o tal do seu conceito, é melhor guardá-lo para quando você fundar a sua religião. Ou será melhor dizer o seu conceito de religião? De qualquer modo, e a julgar pelos seus escritos, o deus do seu conceito deve ser tão filho da puta como o outro. Mas isto é a minha opinião, não tem nada a ver com a sua?
      Já agora, como vai a sua dedicada esposa ateia? Continua a obrigá-lo a lavar a loiça? E o seu melhor amigo ateu? continua a fumar os seus charutos r a beber o seu whiskY? Não são flores que se cheirem, estes ateus.
      Vá lá, continue com a sua verve, que o ateísmo está em vias de extinção. Basta mais meia-dúzia de cruzados, como você e o JoãoC, e essa malandragem desaparece de vez.
      Uma beijoca repenicada da sua
      Pitonisa.

      • stefano666

        nandinho citar Romero e Kolbe é uma anedota de humor negro… a igreja pouco se importa com eles

      • Ateu sim, e daí ?

        Ele já pode fundar o “seu conceito de religião” que glorificará o “seu conceito de deus”. Possui os seguidores necessários. Veja a lista?
        1- antonofernando 2- antoniofernando2 3- cinico 4-xpto 5-jab ou job ?
        6- athan 2000
        Pronto. Já possui meia duzia de seguidores.
        Curioso será a cerimônia de cobrar o dízimo…

    • Citadino

      ” Reprovo os livros abjectos como o Deuterónimo, o Levítico e o Êxodo”.
      Mas esses livros “abjectos” não foram também inspirados por Deus? Você é crítico da obra de Deus ou decide quais os livros que Ele inspirou?
      “não há ninguém, neste mundo, ninguém, que esteja acima de qualquer censura”.
      Quer dizer que Deus está acima de qualquer censura por que não é deste mundo? (quem o inventou é certamente deste mundo!). Então porque fica tão ofendido e agressivo quando alguém critica a religião?
      Leia “A Essência do Cristianismo” de Fuerbach e entenderá a necessidade de criação dos deuses pelo Homem.

  • UmGajo

    Belo texto, Onofre Varela.
    Tem sido um prazer lê-lo por cá com alguma frequência.

    Só uma nota: há dias em que aprecio ouvir Quim Barreiros,,, 🙂

    • Carlos Esperança

      PARA: UM GAJO
      DE: ONOFRE VARELA
      Grato pelas suas palavras.
      Aqui para nós (que ninguém nos ouve), quanto ao Quim Barreiros, ele é um excelente ser humano e também gosto de o ouvir de vez em quando… é bem melhor do que a Ágata (a cantar!…).
      Aquela citação de Wagners, Tchaikovskys e etecéteras… foi só para armar ao fino e em “intelectual-mete-nojo”. Mas ficou bem enquadrado, não ficou?…
      Aceite um abraço.
      E mais. Eu sou gajo para tomar um café consigo, se você estiver no Porto ou redondezas. Vale?

  • kavkaz

    «Bem.aventurados os que têm fome e sede de Ateísmo, porque serão saciados!»

    Do livro “O Testamento Contemporâneo”, kavkaz: 5:6

  • kavkaz

    Bem-aventurados os que têm um coração de rico, porque deles é o Ateísmo!

    Do livro “O Testamento Contemporâneo”, kavkaz: 5:3

    Mateus 5:3

  • kavkaz

    Bem-aventurados os que riem, porque vivem mais tempo!

    Do livro “O Testamento Contemporânei”, kavkaz 5:4

  • kavkaz

    Bem-aventurados
    sereis quando vos caluniarem, quando vos perseguirem e disserem
    falsamente todo o mal contra vós por causa do Ateísmo.

    Do livro “O testamento Contemporâneo”, kavkaz: 5,11

  • Anon imo

    Eis aqui uma boa crítica a chamada moral cristã… http://www.ingersoll.comunidades.net

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